No dia 28 de
outubro de 2015 foi publicada uma matéria no site jornalístico Ibahia acerca da
polêmica medida adotada pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
da Bahia(IFBA) com os seus alunos nas ultimas três semanas. Utilizando como justificativa a garantia da
segurança dos alunos, o Ifba está proibindo a entrada de alunos em suas
dependências com roupas/trajes “inapropriados”. Segundo depoimentos dos
próprios alunos da graduação os seguranças estão autorizados a proibir a
entrada de alunos “trajados de forma não
condizente com a repartição publica”.[1]
Nenhuma
restrição consta no manual do aluno de graduação, entretanto, saias e vestidos
só podem ser usados abaixo do joelho, shorts, camisetas cavadas e sandálias são
totalmente proibidos depois da adoção desta medida. A polemica medida de
segurança aumenta ainda mais quando os alunos acusam os porteiros e seguranças
da instituição de tratamento diferenciado para homens e mulheres. Foram
relatados na matéria abusos em que se permitia a entrada de homens usando bermuda
e sandália e de outro lado se proibia a entrada de mulheres com vestidos acima
do joelho ou até mesmo com roupas não tão expostas.
Tomando como
base a medida adotada pelo Ifba e a sua justificativa de proteger e garantir a
segurança de seus alunos pode-se traçar um paralelo com as ideias defendidas
pelo professor e jurista alemão Bernand Schünemann. Ele traz a ideia de que o
direito penal protege bens jurídicos em ultima ratio, ou seja, somente age
quando for necessário: quando a vitima e o estado tomaram todos os cuidados
para a proteção do bem mas o dano ainda assim ocorreu.[2]
Segundo o autor, o estado além de se voltar para o comportamento do autor deve
também analisar o comportamento da vítima, obrigando esta a ser cuidadosa e
proteger seu bem jurídico, sob pena de a negligencia no cuidado repercutir no desmerecimento da proteção do
bem jurídico e com isso não ser possível interpretar a conduta do agressor como
típica. A vitimodogmática trazida por Schünemann afirma ainda que não é
possível punir o autor do delito também nos casos em que a vitima desconfia que
irá sofrer lesão e continua a negociar com o autor(como no crime de
estelionato).
Percebe-se
portanto que a ideia trazida por Schünemann de uma possível “culpa da vitima”
no delito é o que fundamenta o argumento utilizado pela instituição de ensino
acima reportada. As mulheres, principalmente , deverão se vestir de forma
apropriada, com roupas que não mostrem muito o corpo(vestidos e saias abaixo do
joelho) e sandálias fechadas para que sua segurança seja assegurada. A culpa de
um possível dano seria portanto da roupa utilizada pela mulher e não do autor
do dano. Apropriando-se da ideia do renomado autor e aplicando-a ao extremo em
um caso concreto poder-se-ia até dizer que se uma mulher não tivesse vestida
“adequadamente” na instituição e viesse
a sofrer um dano, sendo vitima de um crime(como por exemplo o estupro) o autor
não deveria ser responsabilizado como uma forma de prevenção geral e
desestímulo ao comportamento negligente da vitima, que não protegeu
adequadamente o seu bem.
Nota-se que a medida de segurança adotada pelo Ifba
tem fortes influências machistas, um vez que ao ser aplicada, trata de maneira
distinta homens e mulheres, sendo mais rigorosa com estas. O raciocínio
implícito nesse modo de pensar é o de que os homens-aquele que agiu livre e
conscientemente-não tem culpa da agressão sofrida pela mulher, pois uma vez que
ela se vestiu “inadequadamente” de forma espontânea e voluntaria, ela saberia e
concordaria com possíveis futuras consequências. Percebe-se, como já foi dito,
a forte afinidade que esse pensamento tem com as ideias de Schünemann.
Portanto, ao
passo que a vitima negligenciou no cuidado com seu bem, o agressor passa a não
ter responsabilidade pelo ocorrido, devendo ficar impune. Dessa maneira,
percebe-se que a medida mencionada reafirma o machismo inerente a sociedade e,
talvez inconscientemente, defende a postura adotada pelos agressores, cabendo a
sociedade o papel de questioná-la.
Karen Kuentzer
[1] Disponível
em: http://www.ibahia.com/detalhe/noticia/estudantes-do-ifba-sao-proibidos-de-entrar-por-conta-de-roupas-inadequadas-entenda/?cHash=35c3c54d86bfd3a2e78a6b1ab2cbfab7
Acesso em: 03 de novembro de 2015.
[2]
SCHUNEMANN, Bernard. El sistema del
ilícito jurídico penal:concepto de bien jurídico y victimodogmatica como enlace
entre el sistema de la parte general y la parte especial. OBRAS,Tomo II.
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